segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Texto #001 – A Arte da Escrita


É um bom título para um blog, A Arte da Escrita, pois deixa transparecer de fato a verdadeira natureza da escrita, que por muitos não é conhecida. Assim como a pintura, utilizamos ferramentas para escrever ou embelezar a obra de arte (neste caso, o texto), e uma delas é a analogia.
Lembro-me que certa vez numa prova de Filosofia no Ensino Médio, havia uma questão que perguntava (obviamente): "qual a importância da liberdade em sua vida?".
Não vou me ater (muito) às tolas respostas escritas pela maioria dos meus colegas de classe, até por que a tolice é relativa ao observador. Lembro-me que alguns colegas focaram-se na liberdade como sendo apenas a permissão dada pelos tutores/pais/responsáveis em sair de casa e embebedar-se divertir-se em festas. Eu analisei a questão em poucas linhas e de maneira um pouco mais profunda: A liberdade não importa para mim. O importante é saber que sou livre e ter consciência de que meus atos geram reações que interferem nas ações de outras pessoas…
Não me lembro do resto. É claro que não pude me prolongar muito, afinal de contas era apenas uma provinha de filosofia de Ensino Médio, e eu tinha 50 minutos para responder. No entanto, hoje eu não apenas diria isso, como tentaria definir a liberdade:
A liberdade é a gama de variações que determinado evento/indivíduo possui que permite que ele ocorra/aja de n maneiras, distintas ou não. Não importa se as variações podem ser escolhidas pelo evento/indivíduo ou se ele as segue inconscientemente.
A explosão de uma granada pode ocorrer de várias formas (isto é, é livre), pois não se pode prever a direção na qual um estilhaço no interior da granada será arremessado. Analogamente, o soldado que lançou a granada era livre para fazê-lo de n maneiras, bem como para não fazê-lo. No entanto, de nada adianta saber o que é a liberdade, pois ela, por si só é apenas uma ferramenta, um meio pelo qual se chega a algum lugar. O importante (continuo pensando assim) é que o evento/indivíduo em questão tenha consciência de sua própria liberdade. Uma explosão não sabe que é livre (e nem poderia, haja vista que não é um organismo, muito menos um circuito dotado de hardware e software) e se deixa guiar pelas leis da Física e da Química em sua trajetória. Já o soldado, apesar de ser livre, muitas vezes não sabe que é, e se permite guiar pelas ordens e leis criadas por outros homens.
Assim, fica claro que a liberdade é uma ferramenta da ação e está intimamente ligada a esta, de modo que não adiantaria nada haver liberdade num mundo sem ação, na verdade, isso seria um paradoxo. Se pararmos para analisar, o livre-arbítrio é uma consequência imediata de um mundo animado (não no sentido de felicidade, mas como contrário de inanimado/inanimação) de modo que essa tal liberdade nada mais é do que a típica superestimação humana pelos aspectos/propriedades que cercam a própria espécie.
Até pouco tempo, o único ponto fraco da liberdade era o determinismo, mas se não me engano, Schrödinger e seu gato deram um fim a isso e declararam o mundo livre (se não livre, pelo menos imprevisível e indeterminável).
Não acredito que haja destino, gosto de pensar no Universo como um sistema dinâmico e imprevisível guiado unicamente pela Teoria do Caos.
Todo esse palavrório sobre a liberdade nada mais foi do que uma analogia sobre as ferramentas e seus ofícios. Não que eu considere inútil debater sobre a liberdade, mas sim por que acho sensato matar dois coelhos com uma cajadada só.
A escrita é sem dúvida nenhuma uma Arte. E ao me referir à arte, refiro-me ao mesmo conjunto que engloba a pintura, o desenho, a escultura, a marcenaria, a construção, a poesia, etc.
No entanto, apesar de tão vasta, a arte não existe por si mesma, não é plena em sua própria existência. Não há arte por arte. Ela vive em função de algo, é como um eterno eixo y de um matemático tradicionalista que não muda as variáveis. Quando um artista cria algo, ele cria por um motivo: comunicação. (por isso não citei a Matemática como uma arte, pois Ela é plena em si mesma).
A arte é a ferramenta da comunicação.
Com efeito, a primeira arte provém da voz. É o meio imediato de comunicação, quase sempre infalível e de uma mutabilidade sensacional. Digo isso (e a partir daqui abandono toda e qualquer forma de arte que não seja apenas falada ou escrita), pois ao falar com alguém você possui a vantagem de ver imediatamente a reação do ouvinte e pode enfatizar ou reformular os métodos que utilizou para comunicar-se com este.
Um exemplo comum é o Stand Up Comedy (Comédia Em Pé), na qual o humorista simplesmente conversa com a plateia tentando gerar humor com situações improvisadas. O indivíduo que pratica essa modalidade de humor deve ter uma capacidade de improviso imensa, bem como conhecimento de cultura geral e atual. Mesmo assim, o seu trabalho ainda é mais fácil que o do escritor, haja vista que o humorista, além de estimular os ouvidos do público, estimula a visão.
Por outro lado, o escritor encontra-se numa situação bem desfavorável (depende do ponto de vista, é claro). No Stand Up o sucesso da comunicação (que é o objetivo no final das contas) depende muito da capacidade interpretativa do ouvinte (geralmente existem pessoas que não entendem as piadas). Já na Escrita, o sucesso depende quase que exclusivamente da boa vontade e da boa interpretação do leitor. Não adianta você ser Tolkien e escrever magistralmente de modo claro e conciso se o indivíduo que lerá o seu livro não quiser lê-lo com empenho, afinco e não se der ao trabalho de imaginar o que está escrito. Qualquer um lê um livro em um dia. Mas compreender o que está escrito nas linhas e entrelinhas do livro, isso leva tempo.
Mas a culpa não é só do ouvinte. O escritor tem de ser bom. Imaginem bem como é difícil convencer alguém a ler alguma coisa… É muito mais fácil ver ou ouvir, pois você apenas fica quieto enquanto alguém faz o trabalho. In other hand, ler exige atenção, e ninguém fará isso de graça. A leitura deve prender o leitor, ele tem de querer abrir o emaranhado de fibras de celulose e decifrar seus caracteres impressos em tinta preta. E esse é outro ponto no qual a fala leva vantagem.
Voltando ao exemplo do humorista de Stand Up, ao ver que a plateia não está se atraindo por suas piadas, o comediante tende a modificar o seu tom ou tentar uma nova abordagem. Isso não é possível num texto. Ao escrever, eu tenho de me imaginar como sendo o leitor de meu próprio texto! Não posso escrever para mim, algo que simplesmente me agrade ou que eu entenda suficientemente bem. Tenho de escrever para outros, pessoas que não conheço, nunca vi e que provavelmente nunca verei (isso ocorre mais no caso de Best Sellers). Devo imaginar-me como essa pessoa, alguém que não faz a mínima ideia do que está sendo escrito, e que a cada novo verso vai descobrindo o que o verdadeiro eu tinha em mente. Escrever é por si só um exercício de previsão.
Claro que existem ferramentas para isso. Assim como existe a lima para afiar a lâmina, a escrita possui suas próprias ferramentas (mesmo sendo a escrita uma ferramenta da comunicação). Julgo a curiosidade uma das mais importantes limas da escrita. O nome do autor também influencia muitíssimo: eu jamais leria "O Cavalo e Seu Menino" se não soubesse que ele faz parte da coleção conhecida como "As Crônicas de Nárnia", de C. S. Lewis.
Mas falando em crônicas, creio que seja essa a pior parte da escrita: as estórias. Compor um artigo sobre determinado assunto ou um livro didático/científico, cujo conteúdo é específico para determinado público que pretende atingir determinado fim é uma coisa difícil, sem dúvida alguma. Entretanto, escrever uma estória de conteúdo vago sem um objetivo claro (talvez tangencie a distração e/ou o lazer) compondo personagens, vidas e dilemas morais/éticos é algo bem pior (eu acho). É claro que existe a facilidade inerente a esse gênero: seus personagens ganham vida própria uma vez que estão compostos. O único problema é compô-los. Também não tenho conhecimento de causa para afirmar que a composição de um livro científico de definições pré-estabelecidas e extensas pesquisas já realizadas na área seja mais fácil que escrever um livro de estória (por estória entenda-se romance, suspense, terror, enfim, ficção em geral).
Independentemente do estilo de escrita que você goste (Odeio poesia, por exemplo), tenho certeza de que este blog será uma excelente ferramenta na divulgação de boas ferramentas…
Até mais
Post Post: Obrigado pelo convite, querido Criador do Blog.

4 comentários:

Fernando disse...

Cara... PArabéns você. Não descreveria com tamanha maestria o significado do nome do blog assim... *-* .\,,/

Unknown disse...

Reference ao parágrafo que fala da confusão com as crônicas, creio que nelas nada haja de vago ou inobjetivo. Uma obra de arte é criada quando o artista tem a necessidade de expressar uma informação que seria dificílimo em um texto dissertativo. São informações de natureza tão abstrata que é necessária uma mídia exótica para expressá-la adequadamente. Cabe à música, às artes plásticas, à literatura, etc. Os personágens de um conto e o mundo em que eles vivem são só um teatrinho subordinado à moral da história.
Veja a máxima "Uma imagem vale mais que mil palavras.". Ela só é verdadeira quando a informação em questão é de natureza pitoresca. É por isso que os críticos de arte são tão complicados, porque eles tentam descrever uma obra de arte usando as ferramentas erradas.

rmmezabarba disse...

Abstrações... estou acostumado com isso, obrigado pelo quase tópico, foi o maior comentário que já recebi... (não que tamanho influa na qualidade de um texto, ou que eu me importe com comentários) e muito obrigado...

rmmezabarba disse...

Eita... não acredito mais numa palavra do que disse... liberdade?